sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

La Mision 2009 !!! A experiência brasileira.




Participei, entre os dias 25 e 28 de novembro, do La Misión 2009, uma competição de 150km, praticando trekking e navegação pela Patagonia Argentina.

É claro que a aventura começou bem antes, mais exatamente na segunda-feira do dia 23, quando cheguei em Villa la Angostura, cidade base da prova. O voo saía de São Paulo com escala em Buenos Aires e daí até Bariloche. De lá, eu deveria pegar um ônibus para chegar na pequena e pacata cidade sede do La Misión. A viagem de ônibus custa 14 pesos (quase 5 dólares) e um taxi sairia 70 dólares.

Como o voo até Buenos Aires atrasou uma hora, sobraram apenas 2h30 para a troca de aeroporto. De Buenos Aires para Bariloche mais 50 minutos de atraso, até desembarcar às 20h10. O problema é que o último ônibus para Villa la Angostura partia às 20h30 e a cidade fica a 10km do aeroporto.

Quando cheguei ao saguão para retirar minha mala reparei num cara que estava no celular, falando sobre a prova. Assim que desligou o celular perguntei se ele iria participar da prova e como iria para Villa la Angostura. Ele me respondeu que tentaria pegar um ônibus e falou para irmos juntos.

Como as malas demoraram chegar, ele ligou para a empresa de ônibus e a atendente sugeriu que pegássemos um taxi até aestrada para tentar encontrar o ônibus no meio do caminho. Pegamos as malas e entramos no primeiro táxi que vimos pela frente. Pagamos 12 pesos cada um para que o motorista nos deixasse no local por onde o ônibus passaria. Beleza…

Beleza mais ou menos. Após uma espera de 20 minutos, percebemos que já tínhamos perdido o ônibus. Já eram 20h50 e acabamos pegando o caríssimo táxi. Negociamos e a brincadeira saiu por 30 dólares para cada um. Menos mal.

Sorte que a cidade é pequena. Apenas 5 x 5 quadras. Me informei com uns transeuntes da cidade e 30 minutos depois encontrei a galera num restaurante. UFA !!!

Fiquei hospedado num albergue onde estavam os voluntários que trabalhariam no evento. Eram quatro voluntários figurassas. Pareciam aqueles dois loucos do filme limite vertical. Organizando meus equipamentos rapidamente para poder dormir pensei como é muito louco viajar sozinho. às vezes você quer perguntar algo ou ter a opinião de alguém e, quando olha para os lados, percebe que terá que decidir sozinho, apenas com os seus pensamentos e experiência.


Acordei às 8h, tomei um chá com biscoito com meus novos amigos Mauro, Mauro, Marcelo e às 9h segui para o pequeno centro de convenções, onde deveria realizar a parte burocrática da competição, isto é, pagar o seguro, alugar um rádio VHF, verificar os equipamentos e fazer uma pequena doação às escolas de Villa.

Uma coisa me ajudou muito, conhecer muita gente da organização, Guri (organizador), Vero, Macelo, Gringo e muitos outros. No centro de convenções encontrei outros competidores que conheci em outras provas como Jose, Luis e Hilenia da Venezuela, Jose Tugores, Oscar, Edgard, Adrian dentre outros da Argentina.

Parte burocrática completa, descobri um supermercado para comprar os alimentos para a prova, almocei com o pessoal da Venezuela e voltei ao albergue para descansar um pouco e pensar na montagem da mochila. Às 19 horas tudo deveria estar pronto, pois teria que retornar ao centro de convenções para pegar o mapa e assistir ao briefing da prova.

Montei 3 kits de comida, um para cada dia de prova, mas no último momento decidi levar apenas dois. Peguei metade do 3o kit e dividi nos outros dois. Escolha certa!!!

Nessa noite fui dormir às 23h, pensando na prova e em tudo que poderia acontecer.

Acordei às 8h30 e terminei de organizar a mochila, que já estava enorme e pesada. Tomei meu café e me direcionei para o centro de convenções novamente para pegar o chip e o cartão de PCs virtuais, dois documentos que eu deveria carregar toda a prova e sem perdê-los, o que para mim foi o mais difícil.



Às 10h saí para comer algo e resolvi comprar uma pochete para tirar um pouco de peso da mochila e facilitar o acesso às comidas durante a prova. Entrei numa loja de equipamentos e me sugeriram uma “pechera”. Não sei explicar o que é, mas vocês poderão ver o que é pelas fotos.

Tudo pronto para a largada !!!

10, 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2, 1 Vaaaaaammmmossssss!!!!!!!

Seguimos o carro da organização pelas ruas de Villa la Angostura até a entrada da primeira trilha. O mais engraçado é que o Guri havia dito que sairíamos em uma marcha para uma largada promocional, pensei então vamos “caminhar tranquilamente” pelas ruas de Villa, mas quando percebi já estava ficando para trás em relação ao primeiro grupo e ao carro. Tratei de começar a trotar para tentar alcançá-los. Quando consegui, o carro saiu em disparada e a boiada saiu correndo numa velocidade incrível. Não podemos esquecer que carregávamos uma mochila de aproximadamente 10kg.



Tentava manter o ritmo mais forte possível e ao mesmo tempo pensava: “se eu manter esse ritmo vou me quebrar daqui a pouco!!!”

De repente comecei a ver alguns focos de neve pela montanha, conferi o altímetro e vi que estávamos acima dos 1.100m acima do nível do mar, em menos de 1 hora de prova. Um pouco mais adiante, começamos a subir uma montanha totalmente coberta por neve, o que me assustou no primeiro momento. Havia uma fila interminável de atletas misioneiros em toda a montanha.

Nessa primeira parte da prova chegaríamos até 1.800m de altitude e por essa razão tive que fazer muita, muita força. Os pés e as mãos estavam gelados, mas eu não parava por nada, nem para comer. Tirava comida dos bolsos e me alimentava andando, pois não queria ficar sozinho na montanha hehehehehe. Só parei para tirar algumas fotos, já que não sei quando poderei voltar a esse lugar tão espetacular.

A noite começou no momento em que descíamos da montanha, primeiro obstáculo vencido. O segundo já se iniciava na trilha, que deveríamos seguir e que cruzava o rio Ujenco por mais de 20x, molhando nossos pés a todo instante. Chegou um momento em que eu não sentia mais os meus pés, o que me deixou bastante preocupado. Tentava mexer os dedos e não conseguia.

Tentei trotar um pouco, mas nada adiantava.

Noite adentro, encontrei um grupo de 6 pessoas e resolvemos seguir juntos até o próximo posto de controle. Como eu estava muito cansado, não naveguei. Aproveitei que estava no grupo e descansei um pouco a mente, ainda estressada com toda aquela neve, frio e os pés congelados, coisas que eu não estou acostumado.

Chegamos no PC Malalco e a partir daí tínhamos 7km de caminhada por um estrada de terra. Iniciamos juntos, porém já eram por volta das 3 horas da manhã e meu ritmo foi diminuindo e fui ficando para trás. O sono me pegou em cheio e fui cambaleando pela estrada totalmente “borracho de sueño”, até encontrar o PC2 às 6h30 da manhã. Nesse ponto podíamos comprar hamburgueres, Coca e algumas guloseimas como biscoitos e balas. Comi um hamburguer, 2/3 do macarrão desidratado que eu havia levado e tomei uma Coca.



Resolvi dormir por 1 hora. Tirei o tênis pela primeira vez, limpei meus pés e os deixei secando enquanto eu comia. Após essa farta refeição, coloquei uma roupa seca, sentei encostado na parede, entrei no meu saco de dormir e dormi. Não podia ter muito conforto senão corria o risco de não acordar. Também me posicionei de frente para onde o Sol nasceria, pois ele seria um despertador natural.

Acordei às 7h45 e encontrei com a dupla de argentinos Cristian e Nicolas e que estavam no grupo da noite anterior. Conversamos e decidimos seguir juntos neste trecho da prova. Saímos às 9h em direção ao Col. Piedritras, a 1.831m de altitude. Para mim pior do que subir é descer, pois as pernas sofrem muito e os joelhos gritam de dor.

Durante a descida, o Cristian começou a sentir fortes dores no joelho, tomou um ibuprofeno e continuou. Queríamos chegar ao PC3 antes de anoitecer, o que parecia possível. Mas durante o trajeto, quando estávamos a menos de 12km do PC3, nos perdemos e abrimos caminho em direção ao PC. Estávamos muito lentos e acabamos demorando 3 horas a mais do que havíamos previsto.

Detalhe: quando encontramos a trilha certa ouvimos um apito, era uma equipe que estava perdida há muito mais tempo que nós. Apitamos, gritamos, eles conseguiram chegar até nós e seguimos juntos. Um dos competidores perdidos era o Luis, um amigo meu da Venezuela, também da categoria solo. Chegamos ao PC3 às 00h30 da sexta-feira, ponto onde a dupla argentina desistiu, pois estavam com os joelhos destruídos.

Conversando com o Luis sobre a prova, combinamos de seguir juntos até a chegada na última parte da prova. Ele não havia dormido nada na noite anterior e estava cansadíssimo e eu também estava beeeemmmmmm cansado. Tínhamos outro trecho de alta montanha e por essa razão falei para dormimos até o Sol nascer. Assim, poderíamos recuperar nossas energias, não corríamos o risco de nos perder na montanha e muito menos termos que dormir lá em cima, morrendo de frio. E foi o que fizemos.

Comemos, cuidamos dos pés e dormimos. Na verdade tentamos dormir. Eu não consegui dormir muito bem, pois o PC era à beira de um lago, com muito frio e vento. Havia uma fogueira. Me acomodei perto dela e tentei dormir.

Não sei quanto tempo depois eu comecei a tremer de frio, quando olho para o lado um dos voluntários se colocou entre mim e a fogueira ∞£∞¢•ª¶∞§£∞§£ !!!!!

Tentava relaxar para dormir mais um pouco, mas um tempo depois voltava a tremer. Não sei dizer quanto tempo isso durou, só sei que às 5h acordei de vez e comecei a me organizar.

Quando eu estava acabando o Luis acordou, se arrumou e saímos às 7h da manhã, rumo ao cerro O’ Connor, a 1.853m de altitude. Um pouco antes de começarmos o ataque ao pico, encontramos um outro argentino Gaston, que seguiu conosco até o final da prova.

Ao nos aproximarmos do pico da montanha avistamos umas aves e pensamos que eram condores. Uma dela pousou bem no pico e por lá ficou. Seguíamos em direção à ave e ela nem se mexia. Foi incrível! Ficamos a menos de 3 metros de uma ave de rapina. Tirei algumas fotos e descobri mais tarde que na verdade era uma águia. Presentes da natureza!!!! Muito Obrigado !!!!


Daí em diante, caminhamos por toda a crista do Cerro O’Connor, uma das partes mais lindas da prova. Também passamos por uma parte muito estreita encoberta por neve, tendo de um lado a montanha e do outro um abismo. Deu medo.

O Luis tinha apenas 1 sanduíche para o dia todo. Como eu tinha um pouco mais de comida, dividimos. Ainda bem que a prova estava no final, pois só me restaram dois saches de gel e uma barra de cereal.

Depois do Cerro O’Connor bastava passarmos por mais um PC virtual e aí sim teríamos apenas 9km até a linha de chegada. Foram os 9km mais longos da minha vida. Pareciam intermináveis e a ansiedade era gigantesca para chegar novamente à Villa la Angostura.



O Luis estava sofrendo muito com os pés, mesmo usando meus bastões de caminhada que emprestei desde a descida do Cerro. Isso também fez com que os 9km ficassem maiores.



Ao cruzar a última esquina antes da chegada, as lágrimas me encheram os olhos e a emoção ficou à flor da pele. Como um flash, passou um filme pela minha mente sobre tudo o que eu havia passado durante a prova: o frio, a montanha, os pés congelados, as mãos doloridas de frio, os PCs, a briga com o sono e principalmente, as pessoas com quem convivi por essas 56 horas de prova.

Luis, Gaston e Eu cruzamos a linha de chegada lado a lado. Nos abraçamos como uma equipe e agradecemos uns aos outros pela força e pelo apoio durante o trecho em que estivemos juntos. Emoção pura.

O meu grande amigo Marcelo Flores, da organização da La Misión, me deu um grande abraço. Um forte abraço, que representou todas as pessoas queridas que eu gostaria de encontrar na linha de chegada, principalmente a Claudia, minha esposa/namorada.

Não contive o choro e a emoção. Era um sorriso só. Foi um grande prazer ter carregado a bandeira brasileira por toda a prova e conseguir cruzar a linha de chegada com ela aberta e tremulante sobre o meu trekking pole.

Ah!! Com tanta emoção, quase esqueci de passar o chip no PC final. Sem isso, teria sido desclassificado.

Cheguei na 76º posição geral (na verdade 74º, pois cruzamos juntos. A posição foi apenas uma questão de ordem de passar o chip) e 44º na categoria solo masculino.

Na verdade o que conta nessa prova é, como o próprio Guri diz: “Llegar és ganar !!!”

Dedico essa minha grande conquista pessoal principalmente à Claudia, minha esposa/namorada, pois sem o apoio dela não conseguiria realizar meus sonhos. Ela é quem me aguenta quando não estou treinando bem, que fica sozinha enquanto fico treinando ou viajando e mesmo assim me incentiva de todas as formas para que eu vá em busca de novas conquistas. Muito obrigado Clau !!!

Dedico também à

minha família Mário (pai), Odete (mãe), Wlad e Adolpho (meus irmãos)

Até a próxima aventura !!!

Sidney Togumi


2 comentários:

  1. Sid; muy bueno el relato .
    Mi esposa/namorada tambien se llama Claudia y tambien aguanta estas locuras de jovenes. una abrazo patagonico.-

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  2. PUTAAAAAA que iradooo!!!
    Fiquei emocionada só de ler, e com sangue no olho para fazer….imagino que foi muitoo difícil, mas a recompensa deve ser tão mais incrível!! Ainda vou faezr esta prova!!
    Parabéns, por ter completado este desafio né?? E pela força, pela garra, pela paciência e sabedoria né? Pois numa prova dessas só o físico e a força não são suficientes, se tu não tiver cabeça não passa do primeiro dia!!
    Bela experiência….
    beijo

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